Entendendo a impulsividade

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Em alguns casos, eu prefiro andar pela cidade para encontrar uma bebida que tanto gosto, do que ir para a academia malhar. Isso sempre me intrigou como nossos impulsos podem ditar o rumo das nossas ações, mesmo quando a razão grita para irmos na direção contrária. Ou seja, eu andar por toda a cidade para tentar achar uma bebida do que ir na academia que seria muito mais proveitoso para minha saúde não tem muita lógica, não é? A psicologia e a neurociência têm mergulhado fundo nesse tema, tentando desvendar o que nos leva a agir impulsivamente. Desde aquela vontade incontrolável de comer um pedaço de bolo até decisões mais sérias, nossos impulsos estão por toda parte, moldando nossas escolhas e influenciando nosso comportamento. Mas afinal, o que são esses impulsos e de onde eles vêm?

Os impulsos são reações automáticas que surgem sem um planejamento consciente. Eles aparecem como respostas rápidas a estímulos externos ou internos e, muitas vezes, nos pegam desprevenidos. Quando nos sentimos ameaçados, o impulso de lutar ou fugir pode nos dominar. Já em situações prazerosas, o desejo de repetir aquela sensação boa aparece sem avisar. O interessante é que esses impulsos não surgem do nada, eles são resultados de processos complexos que acontecem no nosso cérebro, envolvendo emoções, memória, e expectativas.

O exemplo de buscar uma bebida e da academia pode nos mostrar isso. É como se houvesse uma batalha constante dentro de nós: de um lado, os impulsos nos empurrando para ações imediatas; do outro, o controle tentando colocar o pé no freio. A diferença entre os dois é que o impulso é automático, rápido e muitas vezes irracional, enquanto o controle exige reflexão, análise e, principalmente, resistência. E quem nunca se sentiu dividido entre seguir um impulso ou exercer autocontrole? É uma luta interna que todos nós conhecemos bem.

Quando falamos de decisões, os impulsos desempenham um papel importante. Eles podem ser benéficos em algumas situações, como agir rapidamente em uma emergência, mas também podem nos levar a escolhas das quais podemos nos arrepender. Tomar decisões com base apenas no impulso pode ser arriscado — e muitas vezes podem nos levar a situações que não gostaríamos —, porque deixamos de considerar todas as variáveis envolvidas. É por isso que muitas técnicas de tomada de decisão incluem momentos de pausa e reflexão, para que o impulso inicial não seja o único fator a influenciar nossas escolhas.

Neurocientificamente falando, os impulsos estão profundamente ligados à nossa estrutura cerebral. Eles são principalmente regulados pelo sistema límbico, que controla nossas emoções, enquanto o córtex pré-frontal — a parte do cérebro responsável pelo pensamento racional e controle — tenta moderá-los. Em pessoas com um funcionamento normal, há um equilíbrio saudável entre essas duas áreas. No entanto, quando o córtex pré-frontal não consegue exercer seu papel adequadamente, os impulsos tomam a dianteira.

Existem algumas condições de saúde mental em que o controle dos impulsos se torna especialmente desafiador. O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é um exemplo, onde a dificuldade de manter o foco e controlar impulsos é um sintoma predominante. Outros transtornos, como cleptomania (impulso incontrolável de roubar), piromania (impulso de provocar incêndios) e transtorno explosivo intermitente (explosões de raiva desproporcionais), são classificados especificamente como transtornos de controle dos impulsos, cada um com suas particularidades e desafios únicos.

No TDAH, o controle dos impulsos é uma luta diária. Indivíduos com TDAH frequentemente agem antes de pensar, interrompem conversas, e têm dificuldades em resistir a estímulos distrativos. Já nos Transtornos de Controle dos Impulsos, o problema não é a distração, mas a incapacidade de resistir a um impulso que, muitas vezes, pode ser destrutivo para si e para os outros. Ambos os casos exigem intervenções específicas e um entendimento profundo das nuances de cada transtorno.

A ciência do comportamento, por sua vez, enxerga os impulsos como respostas reforçadas ao longo do tempo. Se uma ação impulsiva é recompensada (mesmo que de forma indireta), a tendência é que ela se repita. Da mesma forma, se um impulso é sempre suprimido com punição, a resposta impulsiva pode se tornar cada vez mais intensa. Esse campo do conhecimento tenta entender como moldar o comportamento para minimizar respostas impulsivas prejudiciais e maximizar as benéficas.

Dentro da abordagem comportamental, como o reforço positivo e negativo, são amplamente utilizadas para o controle de impulsos. Essas terapias se concentram em substituir comportamentos impulsivos por respostas mais pensadas, utilizando recompensas e punições estratégicas. A ideia é criar um ambiente em que os comportamentos impulsivos sejam menos frequentes, reforçando aqueles que são mais benéficos e desejáveis.

Por outro lado, nem todos os impulsos são ruins. Na verdade, eles podem ser essenciais para a criatividade e a produtividade. Muitos artistas, escritores e inovadores relatam que seus melhores trabalhos surgiram de impulsos espontâneos. A diferença aqui está na habilidade de direcionar esses impulsos para atividades criativas ou produtivas, transformando o que poderia ser uma distração em um momento de inspiração.

Ao final, entender nossos impulsos é reconhecer uma parte fundamental de quem somos. E de fato, ele pode ser um problema para todos nós quando se torna uma patologia. Mas também ele pode proporcionar um conhecimento para compreender nosso cérebro. E claro, se ele for aproveitado pode gerar uma boa criatividade também. Afinal, é nessa dança entre razão e emoção que se encontra a riqueza da experiência humana.


Referências:

Impulsividade: https://pt.wikipedia.org/wiki/Impulsividade

Insights recentes sobre a neurobiologia da impulsividade: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4242429/

Distúrbios de controle de impulso: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK562279/

Tratamento cognitivo-comportamental para transtornos de controle de impulsos:  https://www.scielo.br/j/rbp/a/65S7wLHCWQVbBS9QBkMHsqq/?lang=en

Outro olhar sobre a impulsividade: o comportamento impulsivo poderia ser estratégico: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC8168538/

 A estrutura da cognição criativa no cérebro humano: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3703539/

A criatividade artística impulsiva como apresentação de alterações cognitivas transitórias: https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/1878614/

Criatividade no TDAH: direcionada a metas Motivação e especificidade de domínio: https://journals.sagepub.com/doi/pdf/10.1177/1087054717727352

Avaliação Comportamental da Impulsividade: Uma comparação de crianças com e sem transtorno de déficit de atenção e hiperatividade: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC1224407/

ABA no tratamento do transtorno de comportamento agressivo e falta de controle de impulsos: https://www.appliedbehavioranalysisedu.org/aggression-and-impulse-control/

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